Quanto vale um copo d’água para quem está com muita, muita sede, depois de passar um dia inteiro no trabalho sem beber uma única gota d’água? E para quem acabou de tomar banho, está descansado, e com a sede saciada? Espero que concorde comigo que a apreciação do valor da água será bem diferente para as duas pessoas. [tweetbutton]O primeiro sujeito, desesperado que está, toparia pagar um preço bem elevado por um copo d’água; e o segundo, provavelmente nem se interessaria em pagar um único centavo. Todavia, um comerciante dificilmente cobraria um preço maior do primeiro e menor do segundo, o que explicita a diferença que existe entre preço e valor.
Esse exemplo parece indicar que a dimensão do preço é objetiva e a do valor, subjetiva. Ou seja, o valor varia de acordo com a vontade e a necessidade das pessoas, ao passo que o preço, que é determinado pela oferta e pela demanda, seria mais objetivo. Na verdade, entendo que ambas as dimensões são subjetivas – afinal, o valor de um bem para uma pessoa varia de acordo com os seus interesses e valores. Por exemplo, uma camisa do Flamengo não tem valor nenhum para mim, que sou vascaíno (e, provavelmente, uma camisa do Vasco não tem valor nenhum para um flamenguista!). Além disso, dizer que o preço é determinado pela oferta e pela procura de um determinado bem não significa que essa dimensão seja objetiva. Embora do ponto de vista macroeconômico a oferta e a demanda possam ser tratados como fenômenos objetivos, do ponto de vista microeconômico são bastante subjetivos, pois dependem dos interesses dos agentes econômicos (nota de advertência: eu não estou utilizando esses conceitos da maneira que muitos economistas os conceituariam. É uma leitura minha a respeito deles).
Mas chega de economês. Warren Buffett, em um de seus aforismas fantásticos, diz que “Preço é o que você paga. Valor é o que você leva”. O que isso quer dizer? Quer dizer que, embora as duas dimensões tenham aspectos subjetivos, do ponto de vista do investidor é possível estabelecer critérios para transformar o investimento em uma atividade relativamente objetiva. O preço é objetivo, da perspectiva do investidor: quem o define é o mercado, e o investidor pouco pode fazer para alterá-lo. Se você quer comprar uma ação, tem que comprá-la pelo preço que o mercado determina. Se você quer comprar um imóvel, também (salvo uma variação obtida com descontos).
Mas como saber se o bem vale o preço que é comprado, ou está sub ou supervalorizado? Para tornar essa avaliação um pouco mais objetiva, o investidor deve estabelecer critérios de análise. Para comprar roupas ou objetos de uso diário, não há muito a ser feito a não ser uma boa pesquisa de preço. Todavia, para analisar investimentos, é perfeitamente possível estipular critérios de avaliação mais objetivos. Por exemplo, uma maneira interessante de fazer isso é estipular um benchmark a ser superado. O que é um benchmark? É um padrão, outro investimento ou um índice que você pode utilizar para comparar a sua escolha. Por exemplo, uma maneira de verificar se as ações de uma determinada empresa valem o preço pelo qual estão sendo vendidas é verificar se você pode esperar razoavelmente que as ações da empresa dêem maiores resultados do que um investimento em renda fixa que tenha rentabilidade igual à Selic. Como você pode avaliar isso? A partir de uma análise dos balanços e dos resultados apresentados pela empresa. Suponha, por exemplo, que uma empresa apresente uma média de crescimento no seu lucro por ação de 15% ao ano, nos últimos 10 anos, e não há motivo para supor que ela vá apresentar resultados inferiores a este nos próximos anos. A relação entre o preço e o lucro da empresa (P/L) é de 5, ou seja, o preço da ação equivale a apenas 5 vezes o lucro anual da ação. Numa situação como essa, o valor da ação é bastante superior ao preçodo mercado, já que a expectativa de rentabilidade do ativo é maior que seu benchmark (15% contra 10,75% da Selic, hoje). Com os imóveis, uma maneira de avaliar o valor do ativo é verificar a relação entre os aluguéis pagos e o preço do imóvel. Normalmente, considera-se que essa relação deve ficar próxima a 6% ao ano – ou seja, o aluguel pago em um ano deve corresponder a 6% do preço estipulado no mercado. Se esta relação for superior a 6%, isso significa que o preço do imóvel está barato; e se estiver muito abaixo disso, que está caro.
Em outras palavras, se você conseguir comprar um apartamento que dê, em aluguéis, mais do que 6% ao ano, você está pagando um preço menor do que o valor do apartamento! E, se ao comprar as ações, você tiver boas ações para acreditar que o lucro da empresa cresça a uma taxa superior a um índice estabelecido (no caso, a Selic), e que o índice P/L é compatível com esse crescimento, você está comprando um ativo por um preço abaixo do seu valor. Existem vários outros critérios a serem considerados, obviamente: no caso do imóvel, você deve considerar a localização do imóvel, a vizinhança e a facilidade de alugar, por exemplo, e no caso das ações, é importante considerar outros fatores, como a dívida da empresa, a relação entre o preço e o valor patrimonial (P/VPA), o ROE, e outros fatores.
Mas o que deve ser frisado é que a maneira mais fácil de lucrar com os investimentos é comprar ativos por um preço abaixo de seu valor. Somente assim alguém pode esperar ter bons lucros. Veja que em nenhum momento falei sobre prever evolução de preços, mas em ter boas razões para esperar que o lucro da empresa cresça ou que o aluguel do imóvel esteja acima da média de 6% ao ano. O bom investidor não deve investir em ações ou em imóveis com a expectativa de que poderá prever como será a evolução dos preços no futuro, mas apenas que o valor do ativo comprado é menor do que o preço de mercado. Essa análise também envolve uma grande dose de subjetividade, mas ao menos torna o sucesso do investimento mais provável.