Uma nova geração de empreendedores aproveita o impressionante crescimento do mercado imobiliário. Seu segredo: investir em regiões que não atraem os gigantes do setor

Uma nova geração de empreendedores aproveita o impressionante crescimento do mercado imobiliário. Seu segredo: investir em regiões que não atraem os gigantes do setor

 

Os jovens milionários da construção

Por Amauri Segalla

 

 

 

Em 2009, os financiamentos imobiliários realizados no Brasil somaram R$ 49,6 bilhões, o maior valor da história. Em 2010, estima-se que o número chegue a R$ 69 bilhões, mas já há quem fale que esta é uma projeção conservadora. Também no ano passado, pela primeira vez o número de unidades vendidas no País por meio de crédito habitacional superou a marca de 1980, quando o extinto BNH (Banco Nacional de Habitação) provocou um crescimento até então jamais visto no setor.
 

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" Algumas capitais estavam caras demais e por isso apostamos no crescimento econômico fora dos grandes centros "
Henry Borenstein, sócio da Helbor

 

Só no primeiro trimestre deste ano, a Caixa Econômica Federal liberou R$ 10 bilhões em financiamentos, um salto de quase 2.000% em relação a seis anos atrás. O cenário favorável puxou as vendas da construção civil, que viu suas receitas aumentarem quase 25% no último ano. Os bancos privados também comemoram os resultados da atividade imobiliária.

Há alguns dias, o Itaú Unibanco anunciou seu balanço do primeiro trimestre. De janeiro a março, o banco elevou em 42% a concessão de crédito para a compra de imóveis. No ano todo, espera-se alta de 50% no volume de recursos liberados sob a forma de cimentos e tijolos. Tudo isso parece extremamente animador, mas não são apenas as grandes instituições financeiras, as principais construtoras e os gigantes da incorporação que estão ganhando muito dinheiro.
 

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" Até pouco tempo atrás, ninguém estava interessado em cidades como Manaus e Belém, e foi aí que investimos com força "
Ricardo Ribeiro, sócio da Direcional

 

Ao lado de espigões como Cyrela, Rossi e Gafisa, empresas como Helbor, Direcional e Patrimóvel aproveitam a febre dos imóveis para faturar milhões. A largada já foi dada, mas a linha de chegada parece ainda distante. Até pouco tempo atrás, o empresário Henry Borenstein, 36 anos, achava que o negócio imobiliário não era algo que merecesse muita atenção no Brasil.

Fundada em 1977 por seu pai, a incorporadora Helbor foi durante quase duas décadas administrada sem muita ambição pela família. O pai, sócio do BCN, banco que há alguns anos foi incorporado pelo Bradesco, não tinha tempo para administrar a empresa de imóveis e a conjuntura não favorecia investidas mais ousadas.

Eles pouco se arriscavam fora de Mogi das Cruzes, cidade na Grande São Paulo onde os Borenstein estavam baseados. A história começou a virar nos últimos cinco anos, quando Henry convenceu a família de que era hora de fazer daquela atividade local, circunscrita a Mogi, um projeto muito maior.
 

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" Durante muitos anos, o Rio de Janeiro foi visto como secundário no mercado nacional, mas isso agora mudou "
 Cláudio Hermolin, diretor da Even

 

Em 2007, na onda de abertura de capital das companhias do setor, a Helbor fez seu IPO (oferta inicial de ações, na sigla em inglês) e captou dinheiro suficiente para expandir a atuação para outras praças. “Fomos buscar cidades que não estavam no foco das grandes incorporadoras”, diz Borenstein.

Com esse espírito, a Helbor investiu em empreendimentos construídos em cidades como Taubaté e São José dos Campos, no interior de São Paulo, Joinville, em Santa Catarina, e Uberlândia, em Minas Gerais. “As capitais estavam caras demais e o crescimento econômico registrado fora dos grandes centros justificava nossa aposta”, diz o executivo.

Os resultados vieram de forma mais veloz do que os próprios sócios da incorporadora esperavam. No ano passado, as ações da Helbor valorizaram-se 383,7%, mais do que a de qualquer outra empresa do segmento (a média do setor foi de 205%) e muito acima do índice Ibovespa, que subiu 82,7%. O milagre? “Fizemos os investimentos certos e contamos com nossa experiência no mercado financeiro”, diz Borenstein.


Segundo ele, o fato de seu pai ter sido sócio do BCN facilitou a abertura de capital e levou a administração do negócio a ser feita “na ponta do lápis.” Eis a explicação:  “Somos obcecados por números”, diz. “Antes de investir em qualquer coisa, fazemos um mapeamento completo da viabilidade do projeto, colocamos tudo no papel e realizamos os cálculos.”

Para o sócio da Helbor, muita gente na área imobiliária perde dinheiro por basear suas ações mais na intuição do que no planejamento. Portanto, não existem tantas oportunidades assim? “Pelo contrário, elas são muitas, o que não quer dizer que qualquer coisa que você lançar vai vender da noite para o dia.”
 

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" Teremos um 2010 histórico e muito provavelmente desempenhos ainda melhores nos próximos anos "
Rubem Vasconcelos, sócio da Patrimóvel

 

A estratégia de investir fora do senso comum foi também o que levou a Direcional Engenharia a erguer um império que vale hoje R$ 1,3 bilhão, pouco menos do que uma companhia do porte da Positivo Informática, maior fabricante brasileira de computadores. Pense bem: se você tivesse alguns milhões na carteira para investir, colocaria seu dinheiro no pouco desenvolvido Norte do Brasil ou daria preferência para as ricas cidades da região Sudeste?

A segunda opção, provavelmente a favorita da maioria das pessoas, não foi a escolhida por Ricardo Ribeiro, 28 anos, sócio da Direcional. “Em 2005, ninguém no mercado imobiliário estava interessado em cidades como Manaus, Porto Velho e Belém, e foi aí que nós entramos”, diz o jovem executivo. Os números comprovam a sua percepção.
 

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"Não dá para ficar de fora de um negócio que vem apresentando uma expansão tão forte"
Francisco Almeida e Silva, superintendente da João Fortes

 

Nos últimos cinco anos, os lançamentos imobiliários no Norte do Brasil saltaram quase 1.000%, marca não repetida por nenhuma outra região. Ribeiro, que concentra 60% de seus negócios em imóveis avaliados em R$ 130 mil (que atendem à faixa de renda beneficiada pelo programa do governo federal Minha Casa, Minha Vida, e que consiste em financiamentos com juros menores do que os praticados em outras categorias), cita com orgulho um feito registrado por sua empresa.

“Há cinco anos, lancei em Manaus o primeiro empreendimento do Norte do Brasil vendido na planta por meio de crédito imobiliário.” O pioneirismo revela o grau de letargia que vivia o setor no Brasil. “Não dá para acreditar que só em 2005 o Norte descobriu esse jeito de comprar um imóvel.”

A Direcional, que teve vendas contratadas equivalentes a R$ 202 milhões no primeiro trimestre de 2010 (alta de 82% sobre o mesmo período do ano passado), obtém atualmente 75% de suas receitas do Norte e Centro-Oeste, justamente onde os gigantes do setor do País não querem atuar. O curioso é que se trata de uma empresa mineira.

Ribeiro repete a fórmula de Borenstein, da Helbor. “O segredo deste ramo de atividade é antecipar tendências, e nisso posso dizer que a Direcional foi bem-sucedida. Quanto tempo essa febre vai durar? “Pelo menos mais uma década. Ou mais.” Nesse ponto, os especialistas concordam.

Esta é maior vantagem do setor imobiliário brasileiro em relação a outros países. Por aqui, apesar da expansão acelerada, ninguém fala em bolha – vale lembrar, foi a crise de crédito imobiliário que levou os Estados Unidos à sua mais profunda crise financeira em quase 100 anos. “Apesar da alta dos últimos meses, ainda há muito espaço para crescimento”, afirma Fábio Nogueira, presidente da Brasil Real State, empresa especializada em financiamento imobiliário.

De acordo com os últimos dados disponíveis, o déficit habitacional brasileiro é de 5,8 milhões de residências. O programa Minha Casa, Minha Vida espera reduzir sensivelmente esse número (um milhão é o total de novas moradias que serão entregues ou estarão em construção até o final de 2010). O problema é que novos lares são formados a cada ano e o País precisa atender a essa demanda que, mediante o crescimento econômico, não para de aumentar.
 

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Afora a conjuntura atual favorável, o Brasil teve a sorte – e a competência – de faturar os dois maiores eventos esportivos do planeta. A Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016 vão estimular novos negócios imobiliários em todo o País. O Rio de Janeiro, obviamente, tende a ser mais beneficiado. “Teremos um 2010 histórico e muito provavelmente desempenhos ainda melhores nos próximos anos”, diz Rubem Vasconcelos, sócio da Patrimóvel, focada no mercado carioca.

Em 2009, sua empresa vendeu R$ 1,8 bilhão, quase o triplo de uma década atrás. Vasconcelos diz que o Rio passará por uma grande transformação urbanística no futuro próximo. “Os imóveis contemplados pelo programa Minha Casa, Minha Vida tendem a substituir os barracos das favelas, cujo aluguel às vezes custa o mesmo preço de uma prestação do financiamento imobiliário”, afirma.

Se sua previsão se confirmar, trata-se de uma das maiores transformações habitacionais em curso no planeta – e uma tremenda oportunidade para novos empreendedores. Uma das mais tradicionais incorporadoras de São Paulo, a Even decidiu sair do conforto do mercado paulista para se aventurar pela primeira vez no Rio de Janeiro.

“Em 2008, as vendas de imóveis no Rio respondiam apenas por 2% das vendas totais da Even”, diz Cláudio Hermolin, que coordena a operação carioca da empresa. “Em 2010, essa participação será de 20%, com tendência de alta maior nos próximos anos.” Segundo o executivo, a escolha do Rio para ser sede dos Jogos Olímpicos teve um efeito imediato na estratégia da empresa. “Durante muitos anos, a cidade foi vista como secundária no mercado nacional, mas agora isso mudou.”

O mercado imobiliário brasileiro iniciou sua virada em 2007, quando muitas construtoras e incorporadoras recorreram à bolsa para levantar capital capaz de sustentar os investimentos necessários para o crescimento do setor. A iniciativa teve dois efeitos práticos. Em primeiro lugar, as empresas encheram os bolsos com algo em torno de R$ 10 bilhões. Depois, o movimento levou à profissionalização das companhias, que na maioria dos casos culminou na substituição da gestão familiar por executivos contratados  no mercado. Com 59 anos de existência, a João Fortes passou por esse processo. Em 2007, a construtora foi vendida para Antonio José Carneiro, mais conhecido como Bode, que vislumbrou ali uma oportunidade de faturar alto.

Naquele ano, a empresa fundada pelo engenheiro João Machado Fortes acumulava dívidas e sofria com o desinteresse dos herdeiros pelo negócio. Bode contratou o executivo Francisco Almeida e Silva para tocar a companhia e os resultados vieram. No ano passado, a João Fortes lucrou R$ 65,8 milhões, ante prejuízo de R$ 5,2 milhões em 2008.

“Os antigos donos não acreditavam no setor imobiliário, e me parece que essa avaliação estava equivocada”, diz Silva. Repaginada e com investimentos em mercados como Brasília e Salvador, a quase sexagenária companhia viu suas ações dispararem 220% em 2009. “Não dá para ficar de fora de um negócio como esse”, diz o diretor da companhia.

 

 

fonte:www.istoedinheiro.com.br